A crescente demanda por combustíveis renováveis e a pressão sobre os sistemas produtivos tradicionais colocaram a biomassa no centro do debate sobre a sustentabilidade global. Em um extenso estudo publicado no Bulletin of the Chemists and Technologists of Bosnia and Herzegovina, pesquisadores investigam os potenciais, limites e desafios da produção sustentável de biomassa e biocombustíveis dentro do contexto da bioeconomia.
O artigo destaca que, embora a biomassa seja o único insumo renovável capaz de atender simultaneamente à demanda por alimentos, energia e materiais, sua aplicação exige uma análise cuidadosa sob os eixos da oferta, demanda e sustentabilidade. Um dos principais dilemas abordados pelos autores refere-se à concorrência entre o uso da terra para alimentos e para energia, o que impõe limites socioambientais à expansão irrestrita de biocombustíveis.
Para mitigar esses conflitos, o estudo enfatiza o avanço de tecnologias que utilizam biomassa não comestível, como bagaço de cana, palha, algas e resíduos urbanos. Esses recursos podem ser processados por rotas termoquímicas, físico-químicas ou bioquímicas em estruturas integradas chamadas biorrefinarias, que se assemelham às refinarias de petróleo, mas operam a partir de matéria biológica renovável.
Dentre essas tecnologias, a gaseificação e a pirólise se destacam na produção de combustíveis líquidos sintéticos e outros compostos químicos. Porém, desafios técnicos, como a purificação do gás de síntese e a complexidade da hidrólise enzimática de materiais lignocelulósicos, ainda limitam a viabilidade econômica de várias dessas soluções em larga escala.
No plano político, o estudo traça um panorama comparativo entre estratégias nacionais. Desde 2012 a União Europeia adota políticas estruturadas de bioeconomia, com investimentos superiores a €13 bilhões nos programas Horizon 2020 e Horizon Europe. Outras economias como Estados Unidos, Japão e Alemanha também implementaram estratégias nacionais alinhadas à redução da dependência fóssil e à promoção da segurança energética.
Contudo, os autores alertam para lacunas críticas nas políticas atuais. A gestão do uso da terra e o consumo sustentável de biomassa ainda carecem de mecanismos robustos para garantir ganhos ambientais reais. A ausência de métodos padronizados de avaliação de impacto e a escassez de dados internacionais dificultam uma governança eficiente da bioeconomia global.
O estudo também reforça o papel estratégico das regiões com alta disponibilidade de biomassa. Em países como Bósnia e Herzegovina, a mobilização de resíduos florestais poderia suprir integralmente as demandas energéticas locais e impulsionar economias periféricas por meio de unidades industriais sustentáveis.
Nas conclusões, os autores defendem que a transição para sistemas produtivos baseados em biomassa não deve se apoiar apenas na disponibilidade abundante do recurso, mas avançar de forma planejada, equilibrando necessidades de energia, alimentos e conservação de ecossistemas. Mais do que um substituto aos combustíveis fósseis, a biomassa é apresentada como um elemento estruturante de novos modelos de produção, que exigem inovação tecnológica, novos arranjos institucionais e participação social qualificada.
Embora os avanços tecnológicos descritos no artigo comprovem a viabilidade da integração da biomassa aos sistemas industriais, o real desafio está em desenvolver uma ecoeficiência sistêmica na qual os benefícios ambientais da bioeconomia superem seus custos, sociais e ecológicos. Nesse sentido, a implementação de biorrefinarias sustentáveis, capazes de aproveitar a totalidade da biomassa disponível, apresenta-se como pilar central na construção de uma economia menos vulnerável a crises energéticas e ambientais.
As evidências reunidas reforçam que a bioeconomia não é apenas uma alternativa tecnológica, mas uma reformulação dos fundamentos da atividade econômica em resposta a desafios estruturais do século XXI. O êxito dessa transição depende, segundo os autores, de políticas públicas orientadas por evidências, colaboração multissetorial e uma mudança profunda na lógica de uso dos recursos naturais.