Pesquisadores transformam bagaço de cana em embalagem condutiva para proteger chips e semicondutores

O resíduo da cana-de-açúcar, amplamente disponível na agroindústria brasileira, ganhou nova aplicação com potencial de substituir materiais plásticos na proteção de equipamentos eletrônicos sensíveis. Pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) desenvolveram um material condutivo e sustentável, capaz de reduzir danos por descargas eletrostáticas, problema bastante comum no transporte e armazenamento de microchips, semicondutores e outros componentes de alta precisão.

O composto, batizado de criogel condutivo, foi produzido a partir de celulose extraída do bagaço da cana e negro de fumo – um subproduto da combustão incompleta de matérias primas vegetais ou derivadas do petróleo. Segundo os pesquisadores, trata-se de uma alternativa promissora às espumas plásticas derivadas de petróleo, que representam riscos ambientais e ainda são amplamente utilizadas pela indústria de eletrônicos.

A estrutura leve, porosa e resistente do criogel garante proteção mecânica, dissipa descargas elétricas e limita a propagação de chamas. Além disso, o estudo mostrou que a condutividade elétrica do material pode ser regulada. Com baixas concentrações de negro de fumo (1% a 5%), o criogel dissipa cargas de forma gradual; com concentrações acima de 10%, o produto se torna um eficiente condutor, adequado para dispositivos altamente sensíveis.

A pesquisa, publicada na revista Advanced Sustainable Systems, foi financiada pela FAPESP e conduzida por cientistas do Laboratório Nacional de Nanotecnologia do CNPEM. A equipe é composta pelas pesquisadoras Gabriele Polezi (também doutoranda da Universidade Federal do ABC), Elisa Ferreira, Juliana da Silva Bernardes e o pesquisador Diego Nascimento. A patente do produto já foi depositada e o CNPEM busca agora parcerias com empresas para viabilizar a produção em grande escala.

“Nosso objetivo é oferecer uma alternativa sustentável para a indústria de embalagens de produtos eletrônicos sensíveis, substituindo materiais plásticos por opções menos poluentes e de alto desempenho”, afirmou Juliana Bernardes, coordenadora do estudo. A declaração reflete o alinhamento do projeto com uma visão da bioeconomia focada na sustentabilidade e no uso estratégico de resíduos agrícolas no setor industrial.

O criogel responde a uma demanda crescente do mercado global. De acordo com o Departamento de Comércio dos Estados Unidos, o setor de embalagens antiestáticas para produtos sensíveis deve alcançar um valor próximo de US$ 5,1 bilhões até 2026. Essa projeção reforça a viabilidade econômica da nova tecnologia e o potencial competitivo que ela representa para o Brasil.

Outro diferencial do material está na versatilidade de suas matérias-primas. Além do bagaço da cana, a celulose pode ser extraída de outros resíduos agroindustriais, como palha de milho e cavacos de eucalipto. O negro de fumo, além de já amplamente utilizado na indústria (especialmente na produção de pneus), tem ampla disponibilidade no mercado.

Embora os custos de produção ainda não estejam definidos, os autores destacam a combinação de fatores que tornam o criogel condutivo promissor: baixo impacto ambiental, alto desempenho técnico e acesso a matérias-primas locais e abundantes. O produto atende à crescente demanda por soluções circulares e funcionais que acomodem os requisitos técnicos da indústria eletrônica sem comprometer metas ambientais.

Com os avanços atuais, os próximos passos preveem testes de escalonamento e ajustes no processo de produção industrial. O sucesso dessa etapa poderá posicionar o Brasil como player estratégico na oferta de materiais sustentáveis para o setor de eletrônicos.

Fonte: Bagaço de cana vira embalagem que protege equipamentos eletrônicos sensíveis

Compartilhar