África se posiciona como chave estratégica para a transição energética global e pode ter no setor de metais verdes um potencial transformador para suas economias e para o esforço mundial em reduzir as emissões de carbono. O continente, considerado o mais pobre do mundo e igualmente o mais vulnerável às mudanças climáticas, detém os recursos minerais essenciais para desbloquear a decarbonização global em face das temperaturas crescentes, que estão elevando os riscos climáticos a patamares alarmantes.
No contexto atual, África concentra 79% das reservas globais de cobalto, 44% de manganês e 21% de grafite, além de significativas quantidades de outros minerais valiosos como cobre e estanho. Estes compostos são classificados como minerais críticos ou metais verdes, cruciais para a fabricação de baterias de veículos elétricos (EV) e painéis solares, e elementos centrais na substituição dos combustíveis fósseis na matriz energética mundial.
Esses dados foram destacados em um recente relatório da Wood Mackenzie e ressaltados durante o Investing in African Mining Indaba, evento em Cape Town. Eve Harper, diretora do portfólio da conferência, sublinhou o objetivo de explorar como o continente pode capitalizar seus minerais para o desenvolvimento sustentável, contribuindo também para as demandas energéticas globais.
Entretanto, um ponto de preocupação é a possível estagnação desses metais no subsolo. Apesar de África possuir cerca de 30% das reservas minerais mundiais, correspondia a menos de 10% das despesas globais com exploração mineira em 2022, conforme o relatório World Exploration Trends 2023 da S&P Global.
A história dos escrambles por recursos na África, marcados por episódios nebulosos e até mesmo tóxicos, como o comércio de marfim no século XIX que financiou o avanço colonial, contrasta com a oportunidade atual que tem o potencial de transformar positivamente o continente e o mundo. Isso por que a crise climática atual, catalisadora dessa busca, pressiona por mudanças.
A NOAA (Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA) anunciou que o ano passado foi o mais quente já registrado. A Dra. Sarah Kapnick, cientista-chefe da NOAA, ressaltou que até que as emissões cheguem a zero, continuaremos a ver recordes quebrados e eventos extremos aumentando. Com a agricultura africana extremamente vulnerável a eventos climáticos extremos, um recorde de 50 milhões de pessoas subnutridas pode ser esperado para o ano de 2024, impulsionado por conflitos e alterações climáticas.
A busca pelos metais verdes pode oferecer uma alternativa: ao invés de exportar minerais e metais brutos ou semi-processados para fabricação no exterior, a exportação desses recursos pode representar ingredientes chave para conter as mudanças climáticas, beneficiando diretamente o continente africano.
Os governos africanos estão cientes do potencial de utilizar os minerais críticos como impulsionadores da inexorável industrialização regional, possivelmente exigindo dos empresas mineradoras investimentos em instalações de processamento, adicionando valor à riqueza de commodities do continente. Questiona-se, porém, se o desenvolvimento dessas capacidades industriais deve retardar a exploração dos minerais ou se as commodities deveriam ser exportadas em sua forma bruta, até que tais capacidades sejam estabelecidas.
O setor de mineração africano, contudo, enfrenta desafios como as alegações de exploração de trabalho artesanal e infantil, especialmente na República Democrática do Congo que produz cerca de 70% do cobalto mundial. Em resposta, a indústria está avançando em práticas mais limpas e sustentáveis, incorporando preocupações de ESG (ambientais, sociais e de governança corporativa) e aprimorando a transparência por meio da adoção de sistemas de cadastro de mineração.
A Wood Mackenzie estima que sejam necessários cerca de 400 bilhões de dólares em investimentos em capital para mineração, refino e fundição de minerais críticos até 2030 para preencher a lacuna entre oferta e demanda e limitar o aumento da temperatura global em 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. África tem uma posição privilegiada para escalar a montanha de investimentos necessários, com a esperança de alcançar esse pico antes que a geleira próxima ao topo do Kilimanjaro derreta para sempre.