Um relatório recente do Instituto Escolhas destaca uma preocupação crescente com a origem do ouro brasileiro, em particular o que é importado pela União Europeia. De acordo com o estudo intitulado Europe’s Risky Gold, cerca de 94% do ouro proveniente do Brasil e adquirido por países do bloco europeu vem de áreas de risco, onde a extração ocorre por meio de garimpos ilegais. Os estados do Pará e Amazonas são os principais fornecedores.
Em 2023, Alemanha, Itália e República Tcheca importaram coletivamente cerca de 1,5 tonelada de ouro dessas regiões. A Alemanha, em particular, adquiriu cerca de 1.289 quilos, com um valor estimado de 78 milhões de dólares, totalmente expostos ao risco de ilegalidade. A situação é semelhante na Itália, onde 71% das importações estão sob o mesmo risco, refletindo um cenário de 254 quilos de ouro avaliados em 15 milhões de dólares.
Esses dados alarmantes impulsionaram debates sobre as práticas de aquisição da União Europeia. A ausência de um sistema robusto de rastreabilidade para o ouro extraído no Brasil agrava a dificuldade em garantir a legalidade do minério. Muitas vezes, o ouro passa por vários intermediários, tornando quase impossível comover sua origem exata.
O relatório do Instituto Escolhas reforça a importância de os compradores europeus adotarem medidas mais rigorosas de devida diligência e promovem a publicação de informações detalhadas sobre as minas de origem e os fornecedores. Tais práticas podem ajudar a diminuir o incentivo ao comércio de ouro ilegal.
Dentro do Brasil, avanços foram feitos no combate à mineração ilegal. A implementação de notas fiscais eletrônicas e o fim do pressuposto de boa-fé no comércio de ouro dos garimpos são passos importantes, embora insuficientes sem a cooperação dos mercados internacionais que continuam a comprar ouro de fontes obscuras.
Larissa Rodrigues, diretora de pesquisa do Instituto Escolhas e responsável pelo estudo, observa que a questão transcende as fronteiras nacionais. Ela ressalta a necessidade de uma colaboração internacional para realmente influenciar o comércio de ouro de maneira ética e sustentável. “Enquanto os importadores continuarem comprando em áreas sensíveis, sem certeza da origem, estarão violando um mercado ilegal”, ressalta.
A situação é ainda mais crítica em locais como a Terra Indígena Yanomami e Munduruku, onde o impacto ambiental e social da mineração ilegal é devastador. Os garimpos nessas regiões não apenas ameaçam o meio ambiente, mas também a saúde humana e o modo de vida das comunidades indígenas.
Assim, a comunidade internacional é chamada à ação. A transparência nas transações, aliada a uma fiscalização mais rigorosa, pode ser a chave para frear o avanço da ilegalidade no setor de mineração brasileira. O diálogo entre os diferentes atores envolvidos—governos, indústrias e sociedade civil—é essencial para promover práticas mais responsáveis e sustentáveis em todo o mundo.
Sendo o Brasil o 14º maior produtor mundial de ouro, uma mudança nas políticas de importação da União Europeia poderia enviar um sinal forte ao mercado de que a responsabilidade social e ambiental é uma prioridade. Isso não apenas protegeria os ecossistemas amazônicos, mas também incentivaria a adoção global de práticas mais éticas e transparentes no setor de mineração.