A comunidade científica deu um importante passo rumo à criação do primeiro genoma de planta artificial, um desenvolvimento que pode ter vastas implicações na bioeconomia. O foco dessa inovação é um musgo conhecido como spreading earthmoss (Physcomitrium patens), que foi parcialmente sintetizado por uma equipe de pesquisa na China. Este avanço foi apresentado recentemente no periódico Nature Plants e simboliza uma etapa essencial na jornada rumo a um genoma vegetal totalmente artificial, segundo Ian Ehrenreich, genético sintético da Universidade do Sul da Califórnia.
Embora a equipe tenha trabalhado apenas em parte de um cromossomo, a significância desse feito não deve ser subestimada. Ele é um indicativo de que genomas sintéticos, que até o momento eram considerados aplicáveis primordialmente aos micróbios, também podem ser uma realidade para organismos multicelulares, conforme destaca Tom Ellis, biólogo sintético do Imperial College London.
A alteração do genoma de um organismo nos permite não apenas investigar questões genéticas fundamentais, mas também potencializar suas capacidades para aplicações na agricultura, indústria, medicina, entre outras áreas. O projeto de levedura, que está perto de ser concluído após 18 anos, exemplifica essa ideia ao simplificar o DNA que não é necessário, adicionar um novo cromossomo e introduzir outras modificações.
Os biólogos sintéticos Junbiao Dai e Yuling Jiao da Agricultural Genomes Institute at Shenzhen, da Peking University, e seus colaboradores, decidiram ir além dos estudos já realizados com Arabidopsis thaliana, outra planta modelo frequentemente utilizada na pesquisa. Uma das vantagens da utilização do musgo é que, diferenciando-se do Arabidopsis, uma única célula de musgo pode crescer formando uma planta completa. Isso implica que, ao engenheirar apenas uma célula, é possível transformar o organismo inteiro.
O projeto SynMoss focalizou primeiro na parte do braço curto do cromossomo 18 do musgo. A equipe empreendeu uma meticulosa reestruturação do DNA, que incluiu a remoção de transposons (elementos móveis do DNA encontrados em eucariotos), a adição de etiquetas curtas para marcar o braço alterado, a padronização dos códigos genéticos que interrompem a síntese de proteínas, entre outras alterações, reduzindo essa seção do cromossomo em 56%. Posteriormente, a estrutura parcialmente sintética foi introduzida em células individuais de musgo e seu crescimento foi estimulado.
As plantas resultantes pareciam normais, reproduzindo-se e resistindo a condições estressantes como níveis elevados de sal tal como suas contrapartes naturais. Contudo, houve uma maior atividade de alguns genes na região sintética, um fenômeno que poderia ser prejudicial. Esses resultados refletem sobre o longo debate sobre a importância dos transposons para eucariotos multicelulares.
O musgo já foi aproveitado para a produção de algumas substâncias químicas, e um medicamento sintetizado por versões geneticamente modificadas da planta está em testes clínicos. O SynMoss pode potencializar esses esforços e levar a mudanças maiores e mais benéficas, segundo o biólogo de plantas Ralf Reski, da Albert Ludwig University of Freiburg.
A equipe planeja agora avançar para o restante do braço curto do cromossomo 18 e, eventualmente, para um genoma de musgo inteiramente sintético, esperando concluir o projeto nos próximos 10 anos. É uma meta ambiciosa, especialmente considerando que o genoma da planta é cerca de 40 vezes maior que o da levedura. Este empreendimento, se bem-sucedido, poderá ter um impacto significativo na bioeconomia e na sustentabilidade, particularmente relevantes a profissionais de engenharia e especialistas do setor que buscam soluções inovadoras e estratégicas.
Fonte: Moss project takes step toward first artificial plant genome, Science