IA brasileira revoluciona inventário florestal na Amazônia e reduz custos em 90%

Uma tecnologia desenvolvida pela Embrapa em parceria com o Fundo JBS pela Amazônia está mudando a forma como as florestas tropicais são estudadas. A ferramenta, chamada Netflora, combina inteligência artificial (IA) e drones para tornar o inventário florestal mais rápido, barato e preciso. Com capacidade de mapear até 3.500 hectares por dia, a inovação representa uma alternativa operacional dez vezes mais econômica que os métodos convencionais, que exigem equipes humanas em campo por semanas.

O uso do Netflora na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã, no Amazonas, demonstrou sua eficácia. Em um único sobrevoo de duas horas, foram identificadas 604 castanheiras-da-amazônia (Bertholletia excelsa) e mais de 14 mil outras árvores em uma área de 1.150 hectares. Um inventário dessa dimensão, com métodos tradicionais, demandaria ao menos 73 dias de trabalho de campo com cinco pessoas.

Com imagens de alta definição captadas por drones e analisadas por IA, o Netflora gera mapas georreferenciados e informações botânicas detalhadas. Esses dados alimentam um banco de imagens que já ultrapassa 70 mil hectares mapeados na Amazônia. Um dos principais resultados é a atribuição de um “endereço digital” para cada árvore, com coordenadas precisas. A ferramenta está disponível em aplicativo e será usada diretamente por agroextrativistas da RDS do Uatumã, que poderão planejar melhor suas atividades e reduzir o esforço físico com a coleta.

A castanha-da-amazônia, cuja cadeia produtiva é central para o sustento de muitas famílias locais, ganha com esse processo um sistema de manejo mais eficiente e sustentável. Segundo a pesquisadora Kátia Emídio da Silva, a tecnologia vai além do mapeamento. Ela também viabiliza a instalação de cabos aéreos para transportar os paneiros de castanha em áreas de difícil acesso, reduzindo os riscos de problemas ergonômicos entre os trabalhadores e ampliando as áreas de coleta para além das zonas tradicionalmente exploradas.

Outro desdobramento importante é o potencial da ferramenta para atrair jovens para o extrativismo, atividade que vem perdendo força devido à dureza do trabalho manual. A introdução de tecnologias acessíveis, como o Netflora, pode reverter essa tendência ao tornar o processo mais atrativo e produtivo. A análise automatizada das imagens também permitiu identificar novas espécies de valor comercial como breu, baru e copaíba, adicionando possibilidades econômicas para a comunidade da reserva.

Entre os desafios que a equipe enfrentou está a complexidade da diversidade florística amazônica, que pode chegar até 300 espécies por hectare. Ainda assim, a IA mostrou habilidade para diferenciar espécies parecidas e reconhecer padrões regionais com base em um banco de dados crescente. Com mais de 60 mil novas imagens incorporadas, a meta é ampliar esse acervo para até 150 mil imagens, reforçando o treinamento dos algoritmos e expandindo o uso da ferramenta para outros biomas.

O Netflora pode ser acessado gratuitamente e utilizado por meio de um notebook colaborativo do Colab, e está disponível no GitHub. Um curso introdutório sobre seu uso também está disponível na plataforma e-campo da Embrapa. A disseminação dessa tecnologia pode beneficiar iniciativas semelhantes de monitoramento ambiental e manejo sustentável em outras regiões do Brasil e do mundo.

Na visão dos pesquisadores, essa solução não é apenas uma modernização de ferramentas técnicas, mas uma ponte entre ciência e saberes tradicionais. Ao entregar conhecimento localizado e acessível às comunidades, ela reforça a autonomia e o protagonismo dos povos da floresta, ao mesmo tempo em que contribui para a conservação dos recursos biológicos da maior floresta tropical do planeta.

Fonte: Aplicativo brasileiro de IA mapeia 3,5 mil hectares da Amazônia em um só dia

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