A aplicação da extração supercrítica à polpa do buriti (Mauritia flexuosa) desponta como alternativa viável para agregar valor à biodiversidade amazônica e consolidar uma cadeia produtiva tecnológica baseada em insumos naturais. Um estudo recente detalha como essa tecnologia permite obter extratos de alta pureza, com concentração significativa de carotenoides, compostos fenólicos e antioxidantes, mantendo a integridade química dos produtos sem exigir etapas posteriores de refino.
Utilizando CO2 como solvente, o método se destaca pela seletividade e caráter ambientalmente responsável. Graças à sua baixa toxicidade e características não inflamatórias, o dióxido de carbono se mostrou eficaz para a extração de compostos lipofílicos sem comprometer sua atividade biológica. A flexibilidade de ajustar temperatura e pressão para otimizar a solubilidade torna esse processo particularmente vantajoso em relação às técnicas convencionais.
Com rendimentos superiores e maior concentração de agentes bioativos, os óleos produzidos com CO2 supercrítico apresentaram até 80% de caroteno extraído da matéria-prima, em contraste com 1% obtido via hexano. Adicionalmente, o processo gera subprodutos valorizáveis, como a farinha desengordurada rica em fenólicos e flavonoides, que viabiliza um aproveitamento integral do fruto e reduz o desperdício.
Do ponto de vista industrial, o estudo evidencia que essa abordagem atende às exigências regulatórias de segurança para produtos alimentícios e farmacêuticos, além de abrir espaço para o buriti em nichos de mercado de alto valor, especialmente os voltados à saúde e bem-estar. O mercado global de betacaroteno, por exemplo, é projetado para crescer 3,93% ao ano até 2025, fornecendo incentivos econômicos concretos para sua adoção.
Contudo, o cenário atual na Amazônia aponta que, apesar do potencial comprovado, ainda não há unidades industriais utilizando extração supercrítica em escala comercial. Os principais entraves são os custos iniciais dos equipamentos — majoritariamente importados — e os desafios logísticos da região. A dispersão geográfica dos produtores, a baixa capilaridade da infraestrutura e o clima quente e úmido elevam a complexidade do processo produtivo.
Diante disso, o desenvolvimento de tecnologias adaptadas à realidade amazônica tem avançado. Pesquisadores da UFPA projetaram um sistema nacional de extração supercrítica simplificado e validaram sua eficácia em condições operacionais locais, eliminando etapas como a liquefação do CO2, que exige sistemas de refrigeração caros e energeticamente intensivos. Essa abordagem resultou em menor consumo de energia e tempo de operação, tornando o processo mais exequível.
A implantação da tecnologia pode gerar impactos positivos ao integrar atores locais na cadeia produtiva. A demanda crescente por insumos de Mauritia flexuosa pode fomentar o desenvolvimento de comunidades extrativistas, desde que haja assistência técnica, incentivo à certificação e práticas de manejo sustentável. Essa articulação é fundamental para que os benefícios sociais e econômicos sejam compartilhados de forma equilibrada.
Ambientalmente, a metodologia dispensa solventes orgânicos nocivos e permite a reutilização do CO2, além de não gerar resíduos em sua operação. Tal característica reforça seu alinhamento com práticas industriais sustentáveis e expande a fronteira de atuação da bioeconomia na região.
Enquanto a expectativa de crescimento do mercado de bioprodutos posiciona o buriti como matéria-prima estratégica, persiste a necessidade de mais estudos focados em escalonamento técnico, viabilidade econômica e estruturação da cadeia produtiva. O mapeamento dessas variáveis é condição essencial para definir alvos de investimento que ampliem a competitividade da região no cenário global.
As conclusões do estudo indicam que associar a biodiversidade amazônica à inovação tecnológica pode promover o fortalecimento de um modelo de desenvolvimento baseado na valorização ambiental e geração de riqueza com inclusão. Mas, para isso, será preciso consolidar articulações entre comunidades tradicionais, instituições de pesquisa, indústria e governos.