Biorrefinaria integrada transforma resíduos alimentares em insumo químico com alta eficiência e menor emissão de carbono

Uma nova pesquisa conduzida por cientistas da The Hong Kong Polytechnic University propõe uma alternativa ambientalmente mais eficiente para o reaproveitamento de resíduos alimentares: a produção do composto químico 2,3-butanodiol (2,3-BDO) por meio de um processo de fermentação não estéril e integrado, conhecido como one-pot bioprocessing.

Segundo os autores, o objetivo foi transformar resíduos de alimentos não esterilizados, coletados na própria universidade, em uma matéria-prima viável para biorrefinarias. O método combina sacarificação enzimática e fermentação em um único processo, eliminando as etapas separadas de pré-tratamento e esterilização, que elevam o custo e o consumo de energia das rotas tradicionais.

O estudo atingiu um título máximo de 78,4 g/L de 2,3-BDO – o que equivale a 85,5% do rendimento teórico – por meio de fermentação em modo fed-batch com alimentação constante por 42 horas. Esse rendimento representa uma melhora de 33,5% em relação ao processo convencional que utiliza etapas separadas de hidrólise e fermentação. A eficiência está associada ao uso da bactéria Klebsiella pneumoniae (cepa PM2), capaz de operar em condições menos exigentes de esterilidade.

Do ponto de vista energético, o sistema desenvolvido demonstrou uma recuperação líquida de energia de -0,86 kWh por quilo de resíduo alimentício processado. Isso indica que o processamento consome menos energia do que é recuperado na forma de produto útil, reforçando o potencial para escalonamento e viabilidade industrial. Além disso, o benefício de carbono foi calculado em 1,41 kg CO2-eq por quilo de resíduo, com uma redução de 97,3% nas emissões em comparação às refinarias de açúcar tradicionais.

Os resíduos utilizados apresentaram alto teor de carboidratos — com cerca de 57,3 g de carboidratos por 100 g de peso seco —, contribuindo para uma produtividade elevada. A composição original incluía arroz, macarrão, vegetais e carnes, com remoção manual de ossos e embutidos, homogenização mecânica e armazenamento a -20 °C antes do processamento.

Além da eficiência na conversão, o estudo se destaca por realizar a fermentação em condições não estéreis, o que reduz significativamente o consumo de energia e os custos operacionais, especialmente em larga escala. O uso de temperatura elevada (50 °C) e pH baixo (4,8) contribui ainda para inibir microorganismos indesejados nativos, como espécies de Lactobacillus, favorecendo a dominância da cepa produtora de 2,3-BDO.

Segundo os autores, o sistema integrado de biorrefinaria para resíduos alimentares representa uma alternativa viável às formas convencionais de descarte, como compostagem e aterro sanitário, alinhando-se a estratégias circulares para redução de emissões e recuperação de recursos. Eles defendem que o avanço e a aplicação de tecnologias de bioconversão exigem engajamento de políticas públicas voltadas ao incentivo de soluções economicamente sustentáveis para o setor de resíduos orgânicos.

No contexto da bioeconomia, a pesquisa se insere entre abordagens que conciliam recuperação de valor e redução de impacto ambiental, com ênfase na mitigação das emissões de gases de efeito estufa, reforçando uma visão de bio-impacto. Os resultados também sugerem que, dada sua flexibilidade e eficiência, o modelo é adaptável a diferentes escalas e tipos de resíduos, desde que respeitadas as variabilidades na composição biológica inicial.

Diante de uma estimativa do UNEP de 1,05 bilhão de toneladas de alimentos desperdiçados anualmente e sua contribuição com cerca de 10% das emissões globais de gases de efeito estufa, os dados apresentados destacam a urgência por soluções técnicas escaláveis e integradas à gestão de resíduos.

Fonte: Energy and carbon-efficient one-pot bioprocessing for upcycling non-sterile food waste into high-yield 2,3-butanediol production

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