O recente encontro da rede Uma Concertação pela Amazônia destacou desafios e oportunidades geradas pela ciência, tecnologia e inovação (CT&I) na região Amazônica. O exemplo da empresa 100% Amazônia foi citado como um modelo que harmoniza processos produtivos tecnológicos com conhecimentos ancestrais dos povos da floresta.
O evento online, intitulado “Amazônias no Centro: ciência, tecnologia e inovação para a transformação socioecológica”, contou com a participação de Fernanda Stefani, cofundadora e CEO da 100% Amazônia, Pedro Wongtschowski, presidente do Conselho Superior de Inovação e Competitividade da FIESP, e Lívia Pagotto, secretária executiva da Concertação, além de outros especialistas e mais de uma centena de participantes.
Stefani enfatizou que o uso da ciência e da tecnologia deve estar integrado ao conhecimento local. “Em todos os lugares da Amazônia, esbarramos em ciência todos os dias. A diferença é que é uma ciência pouco valorizada e quase nunca percebida”, afirmou. Ela destacou ainda a importância de investimentos em CT&I para transformar produtos amazônicos em itens únicos e de alto valor agregado.
Apesar de exemplos inspiradores, Wongtschowski apontou as dificuldades enfrentadas na região devido à falta de dados, políticas públicas e investimentos privados. Ele destacou três medidas urgentes para fomentar a CT&I: reequipar os Institutos de Ciência e Tecnologia da Amazônia, atrair e reter jovens talentos e melhorar a governança dessas instituições.
Atualmente, muitos institutos operam em escala pequena, com recursos escassos e equipamentos antigos. Ele citou o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e o Centro de Bionegócios da Amazônia (CBA) como exemplos de centros de pesquisa que precisam de melhorias.
A transformação de alguns ICTs em organizações sociais foi sugerida como solução. Wongtschowski acredita que o modelo de organizações sociais, como o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) em Campinas e o Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá em Tefé, representa um caminho eficiente para avançar na pesquisa científica.
Outro ponto abordado foi a perda de mercado de produtos amazônicos, como a castanha-do-pará, cuja maior parte da demanda é suprida atualmente pela Bolívia. Produtos como pirarucu, produzidos na China, e açaí, encontrado na Colômbia, Equador e sul da Bahia, são exemplos de culturas amazônicas sendo cultivadas em outras regiões com melhor logística e mão de obra disponível.
Fernanda Stefani compartilhou a trajetória da 100% Amazônia, que em 15 anos exportou aproximadamente R$ 100 milhões em produtos florestais não madeireiros para mais de 70 países. A empresa investiu em CT&I e cooperativas locais, conseguindo transformar frutos amazônicos em produtos de alto valor agregado, como polpas, xaropes e óleos, sempre incorporando o conhecimento ancestral aos produtos.
A indústria da 100% Amazônia, localizada em Belém, é composta pela Fábrica da Floresta, que utiliza linhas automatizadas e robótica em algumas fases da produção, e pela empresa comercial de exportação, que envia produtos com tecnologia de rastreabilidade para fora do país. A fábrica impacta diretamente 590 famílias, representando 40% do potencial projetado, e deve beneficiar mais de mil famílias quando atingir toda a sua capacidade.
Tanara Lauschener, subsecretária de Ciência e Tecnologia para a Amazônia do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), destacou os esforços do governo federal para reanimar o setor de pesquisas científicas. Entre as iniciativas, está a retomada do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), que conta com uma linha de quase R$ 13 bilhões para financiamento de pesquisas.
Os recursos serão aplicados em programas específicos, como o Pró-Amazônia, destinado à região, e o Proinfra, que direcionará 30% dos recursos para o Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Outros editais visam fomentar a conectividade, energias renováveis, tratamento de água e a formação de redes de pesquisa para aumentar o conhecimento sobre a sociobiodiversidade da região amazônica.
Lauschener e outros participantes destacaram a importância de formar e reter talentos locais para superar desafios logísticos e de infraestrutura. Capacitar jovens pesquisadores locais com relação afetiva ao território é fundamental para evitar o êxodo desses talentos e promover o desenvolvimento sustentável da região.
A conclusão de Stefani ressalta a importância da CT&I na transformação da região amazônica, reforçando que a integração entre tecnologia moderna e conhecimentos ancestrais locais é a chave para o desenvolvimento sustentável. A empresária acredita que a tecnologia não substitui o trabalho humano, mas o transforma para ser menos repetitivo e mais especializado.
Fonte: https://pagina22.com.br/2024/06/28/como-amplificar-a-bioeconomia-amazonica-por-meio-da-cti/