Tecnologias de precisão na bioeconomia agrícola: promessas de democratização em cheque

A bioeconomia agrícola vem sendo alvo de intensos debates, particularmente no que tange aos seus aspectos políticos – tais como poder, participação e direitos de propriedade – associados às tecnologias de precisão. Uma análise recente de Sarah Hackfort lançou luz sobre essas questões, questionando se as atuais tendências tecnológicas realmente contribuem para a democratização desse setor. Os achados indicam que, contrariamente às esperanças iniciais, há um fortalecimento do controle corporativo, que perpetua dependências e limita a transparência para os consumidores.

As inovações em agricultura de precisão (AP) e as tecnologias de melhoramento precisas, como as que utilizam New Genomic Techniques (NGT), prometiam não só avanços em sustentabilidade ambiental, mas também democratizar a produção de alimentos e biomassa. Contudo, o domínio de grandes corporações sobre o desenvolvimento e controle dessas tecnologias indica poucos benefícios para pequenas empresas e desenvolvedores independentes, replicando a dependência dos agricultores.

O artigo aponta que, embora a AP teoricamente proporcione uma agricultura mais eficiente e autônoma, na prática, as assimetrias de poder persistem. A dominação corporativa sobre tecnologias e infraestrutura reforça a dependência do agricultor em relação a essas entidades, enfraquecendo o processo de democratização. Analogamente, as NGTs, apesar de seu potencial teorético de acessibilidade, já apresentam uma distribuição desigual de benefícios e controle limitado por poucos atores dominantes no mercado.

Adicionalmente, as considerações feitas sobre os direitos de propriedade intelectual revelam que a forma como os dados agrícolas são geridos e controlados não favorece a soberania do produtor. A ausência de regulamentações claras criou um cenário no qual as grandes empresas detêm a maior parte do controle sobre os dados, com os agricultores frequentemente incapazes de acessar ou gerenciar as suas próprias informações sem custos adicionais.

Em relação às NGTs, especialmente no contexto europeu, observa-se uma disputa sobre a regulamentação destas, que são por vezes equiparadas à tecnologia OGM convencional e, portanto, sujeitas a rigorosas diretrizes de segurança e transparência. A possível desregulamentação na Europa acende o debate sobre os impactos ambientais, sociais e econômicos ainda pouco claros de tais tecnologias, e sobre como a falta de rotulagem pode suprimir a escolha do consumidor e afetar negativamente a produção orgânica.

O artigo conclui que os padrões atuais de controle desigual e restrições de propriedade vinculados às tecnologias, dados e patentes não conduzem à democratização desejada. A sustentabilidade na bioeconomia agrícola não será alcançada sem que haja democratização das tecnologias existentes e futuras em termos de poder, participação e direitos de propriedade.

Para alcançar um modelo mais justo e sustentável, sugere-se a implementação de políticas antitruste eficazes, o reforço da soberania tecnológica e de dados de agricultores e criadores, o apoio à inovação em pequena escala, regulação que respeite o princípio da precaução, especial no que se refere às NGTs, a proibição de patentes sobre métodos de melhoramento ou uso de variações genéticas e avaliações de tecnologia que incluam análise de acesso e controle nas tecnologias propostas.

Fonte: Democratization through precision technologies? Unveiling power, participation, and property rights in the agricultural bioeconomy. Democratization through precision technologies? Unveiling power, participation, and property rights in the agricultural bioeconomy

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