A notícia publicada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) revela um significativo avanço no campo da bioeconomia e da biomedicina: pesquisadores da instituição identificaram no veneno da aranha armadeira (Phoneutria nigriventer), uma toxina que pode ser a chave para o desenvolvimento de um novo medicamento para o tratamento da disfunção erétil. A pesquisa, líderada por Maria Elena de Lima, ex-professora do Departamento de Bioquímica e Imunologia da UFMG, atuando no estudo há quase duas décadas, chama atenção pela capacidade de transformar uma substância perigosa em uma esperança terapêutica.
O peptídeo, denominado BZ371A, já possui 22 patentes internacionais e nove aplicações. A capacidade de inovar a partir da biodiversidade é exemplificada nessa pesquisa, destacando a importância de preservar a fauna como uma fonte riquíssima e ainda pouco explorada de moléculas bioativas. O processo avançou a ponto de o candidato a fármaco ter passado pela primeira fase de testes clínicos, autorizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), comprovando não ser tóxico para humanos.
Esse potencial medicamento se diferencia por ser de uso tópico, resultando em vasodilatação e aumento de fluxo sanguíneo local, o que pode beneficiar homens que não podem utilizar os tratamentos orais atuais disponíveis no mercado, como o Viagra e o Cialis, pelos riscos e efeitos colaterais associados a essas medicações. Isso inclui pacientes hipertensos ou com diabetes grave, representando cerca de 30% dos homens com disfunção erétil.
A Biozeus Biopharmaceutical, empresa que adquiriu a patente do BZ371A, prepara-se para a fase 2 dos ensaios clínicos, que testará o peptídeo em homens que passaram por prostatectomia. Paulo Lacativa, diretor executivo da Biozeus, enaltece a UFMG como uma das instituições líderes na inovação em produção de medicamentos no Brasil e expressa a expectativa de que esse projeto possa influenciar positivamente todo o ecossistema inovador do país na área farmacêutica.
A pesquisa coletou experiências construídas ao longo de várias fases, desde a extração e o estudo inicial da toxina da aranha pela Fundação Ezequiel Dias (Funed) até o desenvolvimento do peptídeo sintético para uso tópico. A colaboração entre universidade e iniciativa privada demonstra um modelo bem-sucedido de transferência tecnológica que poderá, segundo os responsáveis, potencializar o tratamento do câncer de próstata ao reduzir a relutância ao tratamento causada pelo medo da disfunção erétil pós-cirúrgica.
A descoberta também sugere potencial para desenvolvimento de tratamentos para a disfunção sexual feminina, outra área de grande necessidade clínica. Por fim, a pesquisa sinaliza uma mudança de paradigmas na concretização de soluções médicas emergidas do rico bioma brasileiro e fortalece a necessidade de uma postura sustentável e preservacionista que reconhece a natureza como geradora de valor e soluções de saúde.