Embora o uso de bambu na construção civil seja apontado como uma alternativa sustentável, uma nova análise revela que a produção artesanal de varas de bambu na região amazônica brasileira apresenta impactos ambientais significativos, especialmente na saúde humana. É o que mostra um estudo publicado no Brazilian Journal of Science, que utilizou a metodologia de Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) para mapear os impactos ambientais associados à produção artesanal da espécie Guadua angustifolia em Rio Branco, no estado do Acre.
Segundo o estudo, a categoria de impacto mais expressiva foi a Toxicidade Carcinogênica Humana, que respondeu por impressionantes 93% do impacto ambiental total associado à produção. Esse resultado é condicionado principalmente ao uso de ácido bórico e bórax no tratamento químico das varas. Cerca de 91% desse impacto está relacionado aos resíduos gerados durante o processo, incluindo aparas, cortes e varas descartadas.
O processo de produção cobriu toda a cadeia, desde o plantio em sistema agroflorestal até a imersão dos bambus em soluções químicas para conservação. Durante o tratamento, aproximadamente 13% das varas foram descartadas por danos estéticos ou estruturais, e o volume de efluente descartado no solo representa 10% da água utilizada. Além dos riscos à saúde dos trabalhadores, esses resíduos representam uma ameaça direta aos recursos hídricos locais.
Outras categorias de impacto relevantes incluem a Eutrofização de Águas Doces (4%) devido ao uso de fertilizantes químicos no plantio e o Uso da Água (1,6%). Apesar da elevada pluviosidade amazônica eliminar a necessidade de irrigação, o processo de tratamento ainda demanda volume significativo de água. Fertilizantes à base de nitrogênio e fósforo também podem contribuir para a degradação de corpos hídricos na região.
A pesquisa destaca a necessidade de reformulação na forma como o bambu é processado em unidades artesanais. Técnicas alternativas como tratamentos térmicos ou o uso de nanotecnologia devem substituir gradativamente os químicos atualmente utilizados. A gestão de resíduos sólidos e o reuso da água também figuram como ações prioritárias para reduzir os impactos ambientais do processo produtivo.
Apesar dos impactos ambientais associados à sua produção, o bambu segue como materiais promissor do ponto de vista climático. Sua capacidade de armazenar carbono pode contribuir para a mitigação das mudanças climáticas, enquanto sua inserção na construção civil substitui materiais intensivos em emissões como o aço. Além disso, sua produção tem elevado potencial de geração de emprego e renda local no contexto amazônico, onde há carência de alternativas econômicas sustentáveis.
No caso analisado, três trabalhadores atuam em uma unidade de produção de apenas 3 hectares, com um ganho mensal médio 35% superior ao salário mínimo nacional. A produtividade anual estimada foi de 1.500 varas de bambu tratadas por unidade, com renda bruta anual de aproximadamente US$ 1.300,00 por hectare.
O estudo também propõe diretrizes tanto para o nível da produção quanto para a formulação de políticas públicas e incentivos de mercado. Em nível local, há necessidade de melhorar o manejo da cultura e a eficiência do tratamento das varas. No campo institucional, os autores sugerem campanhas de valorização do bambu, incentivos fiscais, certificações e editais de fomento à inovação para produtos derivados do bambu.
Os autores concluem que, apesar de o bambu representar uma alternativa viável para o desenvolvimento sustentável na Amazônia, é necessário um esforço coordenado para reduzir os impactos ambientais hoje concentrados especialmente no tratamento químico. A continuidade e expansão dessa cadeia produtiva exigem investimentos em inovação, capacitação e regulamentação ambiental adequada.