Na última semana, o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, aproveitou a cúpula anual do G20 para impulsionar uma nova iniciativa global destinada a combater a fome e a pobreza extrema. Em um movimento que promete revitalizar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), Lula instigou a formação da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, oferecendo ao G20 uma oportunidade para recuperar sua relevância em cenário internacional.
A criação da Aliança Global busca implementar um modelo de parceria no qual os governos desenvolvem planos nacionais para acelerar a erradicação da desnutrição e da pobreza. Os membros da aliança se comprometem a mobilizar apoio e financiamento acessível para esses esforços. As estatísticas das Nações Unidas são alarmantes, com mais de 700 milhões de pessoas afetadas pela fome, incluindo uma a cada cinco pessoas na África Subsaariana. De acordo com as tendências atuais, os níveis de pobreza extrema em 2030 serão o dobro dos almejados pelos ODS.
Inspirada na campanha original de “fome zero”, lançada por Lula em 2003 e reintegrada após sua recente reeleição, a Aliança Global reúne crescimento inclusivo, transferências de renda redistributivas, investimentos em agricultores e programas universais de merenda escolar. Essa abordagem já havia desencadeado uma bem-sucedida transformação no desenvolvimento humano do Brasil, e agora o desejo é replicar globalmente esse modelo.
A recente recuperação do Brasil no cenário multilateral, após anos de isolamento sob a gestão anterior, reforça a capacidade do país de liderar iniciativas globais. Como Lula frequentemente declara: “O Brasil está de volta”. O desafio agora é transformar essa agenda em ações concretas.
Um relatório do Overseas Development Institute (ODI) destaca as dificuldades, como a fragmentação da ajuda, que atualmente totaliza cerca de 75 bilhões de dólares anuais. Apenas uma pequena fração desses recursos vai diretamente para os orçamentos nacionais, enfraquecendo a autonomia dos países beneficiários. Além disso, a dívida insustentável está sufocando os gastos públicos em áreas essenciais como nutrição, saúde e redução da pobreza. A falta de soluções eficazes para o alívio da dívida está levando muitos dos países mais pobres à insolvência e a uma potencial “década perdida” de desenvolvimento.
Por outro lado, o relatório aponta oportunidades significativas. Um grupo independente de especialistas apresentou ao G20 propostas práticas para desbloquear 500 bilhões de dólares em novos financiamentos acessíveis, com um terço desse montante em condições concessionais. Além disso, a estrutura comum do G20 para alívio da dívida precisa de uma revisão para se tornar eficiente. A adoção de uma postura mais robusta sobre a dívida comercial pode mudar esse cenário.
O documento do ODI também sugere iniciativas práticas que podem gerar grandes resultados antes do prazo dos ODS em 2030. Pequenas quantias de auxílio direcionadas eficazmente para a saúde materno-infantil, transferências de renda e agricultura de pequenos produtores podem ter impactos significativos. Com governos de países mais pobres se esforçando para expandir os programas de merenda escolar, um investimento de 1,2 bilhão de dólares em auxílio poderia alcançar mais de 230 milhões de crianças, combatendo a fome, melhorando resultados educacionais e reduzindo desigualdades.
Para o Reino Unido, envolver-se nesta Aliança Global representa uma oportunidade de restaurar sua reputação no desenvolvimento internacional. Mesmo em um ambiente fiscal limitado, o governo britânico pode sinalizar sua intenção de mudança. Um teste inicial será o compromisso financeiro com a Associação Internacional de Desenvolvimento do Banco Mundial, a principal fonte de financiamento acessível para países mais pobres. A atuação do Tesouro britânico na crise da dívida passada, liderada pelo então chanceler Gordon Brown, pode servir de exemplo, implementando novamente um alívio mais abrangente da dívida e protegendo orçamentos sociais críticos dentro dos programas do FMI.
Depois de anos marcados por cortes de ajuda e pela fusão imprudente do Departamento para o Desenvolvimento Internacional (DfID) ao Ministério das Relações Exteriores, o Reino Unido tem agora a chance de ser uma força promotora de mudanças positivas. Com um orçamento de 19 bilhões de dólares em 2023, o país ainda é um dos maiores doadores de ajuda internacional e possui uma voz significativa em instituições como o FMI, o Banco Mundial e a ONU. Apoiar a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza permite ao Reino Unido mostrar ao mundo que, assim como o Brasil, está novamente disposto a agir como uma força progressista para mudanças reais.