A contaminação por microplásticos (MPs) já alcançou níveis alarmantes nos ecossistemas terrestres, aquáticos e atmosféricos, com implicações diretas para a saúde humana e animal. É o que aponta uma ampla revisão publicada na revista Science of the Total Environment. Os MPs, definidos como partículas plásticas com menos de 5 mm de diâmetro, têm sido detectados em águas potáveis, alimentos e até em tecidos humanos. Sua presença está associada à disfunção celular e inflamações devido à capacidade de penetração no trato digestivo, respiratório e pele.
A revisão sintetiza mais de 500 artigos publicados entre 2021 e 2025, analisando a eficácia de estratégias de biorremediação e biomonitoramento aplicadas à poluição por microplásticos. O trabalho descreve três principais abordagens de biorremediação: o uso de enzimas específicas para degradação de determinados tipos de plásticos, a aplicação de microrganismos (como bactérias e fungos) para atuar sobre uma diversidade maior de MPs e a fitorremediação, que utiliza plantas para remover grandes volumes de poluentes do ambiente.
Segundo os autores, consórcios microbianos e enzimas geneticamente modificadas estão entre as soluções mais promissoras, apresentando eficiência significativa na degradação de partículas em ambientes controlados. No entanto, destacam que a aplicação em escala real ainda enfrenta limitações técnicas e econômicas, além da necessidade de protocolos padronizados de otimização e monitoramento.
Além da biorremediação, as ferramentas de biomonitoramento vêm sendo aprimoradas para permitir a detecção e rastreamento precisos dos MPs nos ecossistemas. Técnicas como biossensores, espectroscopia e imagem estão sendo combinadas à análise de bioindicadores — como mexilhões e zooplânctons — que acumulam microplásticos em seus tecidos, possibilitando o mapeamento da poluição em áreas específicas.
O estudo também integra essas estratégias ao conceito de bioeconomia circular, sugerindo que a substituição de plásticos convencionais por materiais biodegradáveis derivados de microalgas ou resíduos lignocelulósicos pode reduzir substancialmente o impacto ambiental do plástico. No entanto, os autores ponderam que a sustentabilidade desses novos materiais depende não apenas de sua origem, mas também de como são produzidos, utilizados e descartados.
Um dado relevante trazido pela revisão é a baixa taxa global de reciclagem de plásticos, que permanece estagnada em cerca de 9%, enquanto a produção mundial ultrapassou 400 milhões de toneladas métricas em 2022. Essa discrepância entre produção e reaproveitamento tem impulsionado a dispersão de MPs e a intensificação de seus impactos ambientais, principalmente em países com sistemas ineficientes de gestão de resíduos, como China, EUA e Índia.
A revisão aponta que práticas físicas convencionais — como coagulação e filtração — são insuficientes para mitigar a contaminação por MPs em grandes volumes, reforçando a necessidade de desenvolver tecnologias biológicas que sejam específicas, eficientes e ambientalmente seguras. A integração entre monitoramento e biorremediação é apresentada como uma via estratégica para aumentar a eficácia e segurança do processo de remoção de MPs.
Para os autores, o próximo passo crucial é a criação de soluções integradas adaptadas ao ecossistema em questão, aliadas a políticas públicas preventivas voltadas à contenção de resíduos plásticos na origem. A interface entre inovação tecnológica e regulação ambiental será determinante para conter os impactos dos MP nos sistemas naturais e na saúde pública nas próximas décadas.