Produtos florestais não madeireiros ganham força como alternativa para financiar reflorestamento

Produtos florestais não madeireiros podem ser uma alternativa viável para financiar a restauração da Mata Atlântica, especialmente diante dos elevados custos e do retorno econômico demorado das abordagens tradicionais como o manejo de madeira e créditos de carbono. Essa é a principal conclusão de um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de São Paulo, publicado na revista Ambio.

Ao analisar 46 parcelas de floresta em regeneração no Vale do Paraíba do Sul, em uma área total de 41.400 m², os cientistas registraram 5.181 árvores de 329 espécies, sendo 283 nativas. Delas, 167 espécies (59%) apresentaram potencial de uso bioeconômico, com destaque para aplicações medicinais (58%), cosméticas (12%) e alimentícias (5%). Esse mapeamento foi feito com base em uma revisão de 603 artigos científicos.

Embora o potencial seja vasto, o estudo revelou que apenas 13% dos materiais analisados alcançaram a fase de desenvolvimento de produto final. Além disso, uma investigação em bases de patentes mostrou que 78 das espécies com potencial têm registros de patentes em 61 países, mas apenas 8% dessas inovações foram registradas no Brasil, sinalizando uma lacuna em termos de apropriação tecnológica e oportunidade de desenvolvimento local.

Entre as espécies mais promissoras estão Euterpe edulis (juçara), Syagrus romanzoffiana (gerivá) e Araucaria angustifolia (araucária), todas já conhecidas por seu uso alimentar e potencial para exploração comercial sustentável. O destaque se dá não apenas por seu uso direto, mas também por seu potencial sinérgico de fomentar cadeias bioeconômicas envolvendo setores como biotecnologia e cosméticos.

Um aspecto relevante é que a extração de produtos não madeireiros, por ser baseada em folhas, frutos e sementes, permite o uso não destrutivo da floresta, mantendo sua integridade ecológica e proporcionando retornos mais rápidos que a extração de madeira, restrita por lei em áreas de preservação como margens de rios e encostas.

Os autores defendem que essa abordagem adiciona multifuncionalidade às áreas restauradas, ao combinar conservação com geração de renda. Isso pode tornar projetos de reflorestamento mais atrativos para proprietários rurais e ampliar a aceitação da restauração como estratégia econômica, especialmente em um cenário onde o Brasil tem a meta de restaurar 12 milhões de hectares até 2030.

Embora as possibilidades de mercado para esses produtos sejam promissoras, o estudo alerta que é essencial regulamentar o uso, com planos de manejo adequados, para evitar a repetição de casos como o do pau-rosa, alvo de exploração predatória e atualmente ameaçado de extinção. A sustentabilidade da cadeia produtiva depende de políticas públicas como certificações, compras governamentais e incentivos para pesquisa e desenvolvimento.

Outro desdobramento possível do estudo é a replicação da metodologia em outros biomas. O cruzamento de dados de abundância, potencial de uso e registros de patentes pode orientar projetos de restauração ativa, incluindo espécies raras com alto valor econômico no plantio e aprofundando o conhecimento sobre espécies abundantes ainda subutilizadas.

O trabalho também reforça o potencial gerador de empregos da restauração, com estimativas anteriores indicando a criação de até 2,5 milhões de postos de trabalho se o país cumprir sua meta climática. Esses empregos, majoritariamente para trabalhadores com baixa qualificação formal, fortalecem a dimensão social da bioeconomia associada à restauração florestal.

As evidências apresentadas posicionam os produtos não madeireiros como uma ferramenta viável para equilibrar conservação e desenvolvimento econômico. No entanto, o avanço dessa estratégia depende de vontade política, investimento em ciência aplicada e uma gestão cuidadosa dos ecossistemas restaurados.

Fonte: Bioeconomic opportunities in restored tropical forests

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