O cenário regulatório brasileiro para as finanças sustentáveis está em pleno debate diante de uma assimetria que chama atenção: enquanto o Banco Central (BC) avança em suas políticas de risco Ambiental, Social e de Governança (ASG), outras entidades, como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a Superintendência de Seguros Privados (Susep) e a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), enfrentam desafios para acompanhar o mesmo ritmo.
Em termos de financiamento, o mercado de crédito tem predominância sobre o mercado de capitais no Brasil, porém há um crescente e preocupante fenômeno: empreendimentos ligados a irregularidades ambientais e sociais, que incluem desmatamento ilegal e trabalho análogo ao escravo, estão buscando e encontrando financiamento por meio do mercado de capitais, que não possui regulamentação específica e eficaz para impedir tais práticas.
As instituições financeiras, principalmente pelo viés dos investidores institucionais, como seguradoras e entidades de previdência, são reguladas pela Susep e pela Previc, que já incluem em suas normas a necessidade de gerir riscos ASG. No entanto, a CVM, responsável por exigir transparência nas informações fornecidas ao mercado pelos emissores de ativos financeiros, ainda apresenta lacunas significativas nesse sentido, especialmente no que se refere à gestão de riscos ASG vinculados a produtos financeiros.
O agronegócio, um dos pilares da economia brasileira, é um dos maiores atingidos por essa deficiência regulatória. Instrumentos como Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRAs), Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) e Fundos de Investimento em Direitos Creditórios do Agronegócio (Fiagro) se destacam na captação de recursos, alcançando valores próximos aos disponibilizados pelo crédito rural, mas a regulamentação sobre a diligência socioambiental é insuficiente ou inexistente.
Destaca-se que a CVM publicou recentemente uma consulta pública para rever normativas sobre o Fiagro, mas o projeto não aborda a questão ASG apesar das evidências de que esses fundos possam estar financiando atividades com graves impactos ambientais e sociais. Diante dessa realidade, a importância do alinhamento dos reguladores financeiros brasileiros às agendas climática e socioambiental torna-se cada vez mais inadiável.
Por fim, a totalidade dos recursos disponibilizados para o Plano Safra e os valores significativos atribuídos ao agronegócio via mercado de capitais evidenciam a necessidade de diligências mais rígidas e transparentes, alinhadas às expectativas de um mercado cada vez mais consciente dos seus impactos no mundo. A discussão em torno da regulamentação efetiva e alinhada com as questões ASG é urgente e necessária para garantir a sustentabilidade futura de setores vitais para a economia e para a sociedade.