Brasil pode utilizar mais das águas subterrâneas durante estiagens e evitar crises hídricas, afirmam cientistas

As águas subterrâneas, detentoras de 97% de toda a água doce líquida do planeta, vêm sendo destacadas por pesquisadores como essenciais para garantir a segurança hídrica mundial. Segundo Ricardo Hirata, professor do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (IGc-USP), esta fonte poderia ser mais explorada no Brasil, especialmente durante períodos de estiagens, para prevenir crises hídricas.

Durante o evento do Ciclo ILP-FAPESP de Ciência e Inovação de 2023, especialistas como Hirata sublinharam a necessidade de um melhor planejamento que incorpore as águas subterrâneas como um complemento às fontes hídricas atuais. Com a previsibilidade das estiagens, a infraestrutura e a gestão desses recursos se tornam ainda mais cruciais para mitigar o impacto em épocas de pouca chuva.

Enquanto em vários países europeus o consumo de águas do subsolo é significativo — 75% na Alemanha e 100% na Dinamarca —, no Brasil apenas 18% dos municípios utilizam esta como sua principal fonte. Para Hirata, os aquíferos funcionam como grandes reservatórios que podem auxiliar substancialmente na gestão de recursos hídricos.

O uso consciente e estratégico das águas subterrâneas não se apresenta apenas como uma solução para crises iminentes, mas também como parte integrante dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 das Nações Unidas, impactando positivamente questões de fome e redução da desigualdade, conforme ressaltado por Carlos Américo Pacheco, diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo da FAPESP.

Outro defensor da diversificação das fontes hídricas é Rodrigo Lilla Manzione, professor da Universidade Estadual Paulista (FCTE-Unesp), que citou a crise hídrica de 2018 e como sistemas mistos de abastecimento (superficiais e subterrâneos) beneficiaram os municípios da bacia do Paranapanema.

Porém, desafios como o saneamento deficiente e a necessidade de uma legislação mais eficaz foram mencionados. Luciana Cordeiro de Souza Fernandes, da Universidade Estadual de Campinas, alertou que apenas 11 estados brasileiros, além do Distrito Federal, possuem legislações específicas para regulamentar o uso das águas subterrâneas.

O evento destacou que a legislação ambiental deve ser fundamentada na ciência e que um uso planejado e regulado do solo é imprescindível. Assim, ao invés de ser um obstáculo, as normas deveriam facilitar o uso sustentável dos recursos hídricos.

A conclusão dos especialistas é que, diante das mudanças climáticas globais, as cidades precisam adotar estratégias variadas para garantir o abastecimento de água, incluindo o reúso para atividades não potáveis, deixando os recursos mais valiosos disponíveis para o consumo humano e reduzindo a vulnerabilidade especialmente dos mais pobres.

A diversificação das fontes de abastecimento, a adequada gestão dos recursos hídricos e a implementação de políticas públicas baseadas em ciência são apresentados como caminhos viáveis para evitar que períodos de seca se transformem em crises hídricas severas.


Fonte: https://agencia.fapesp.br/brasil-pode-usar-mais-as-aguas-subterraneas-durante-estiagens-e-evitar-crises-hidricas-dizem-cientistas/50347

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