Embora promissora como estratégia para o desenvolvimento sustentável, a bioeconomia europeia ainda não desempenha um papel transformador no avanço dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Essa é a principal conclusão de um estudo recente que examinou mais de 1.380 indicadores de bioeconomia e 2.200 indicadores relacionados aos ODS em 48 países da Europa.
Utilizando uma base de dados inédita e extensa, fundamentada nos princípios da FAO para uma bioeconomia sustentável, os pesquisadores identificaram que apenas 11,6% das interações entre práticas de bioeconomia e os ODS são sinérgicas com direção clara. Já 9,5% correspondem a trade-offs, ou seja, situações em que o avanço da bioeconomia compromete o progresso dos ODS, ou vice-versa. A maioria das interações (cerca de 76%) permanece sem direção definida, refletindo limitações de dados e complexidade sistêmica.
A análise detalhou os efeitos da bioeconomia sobre metas específicas, revelando que o ODS 13 (Ação contra a mudança global do clima) é o mais influenciado. Práticas de bioeconomia podem contribuir para a redução de emissões de CO₂, mas também provocar impactos negativos significativos, como mudanças no uso do solo e intensificação agrícola, que liberam carbono estocado. Por outro lado, o ODS 15 (Vida terrestre) mostrou a influência mais positiva sobre a bioeconomia, ao fortalecer serviços ecossistêmicos essenciais para cadeias produtivas sustentáveis.
A partir de redes de correlação e direção de influência entre critérios da bioeconomia e metas dos ODS, o estudo mostrou que governança e cooperação internacional são os elementos com maior potencial para fomentar sinergias sustentáveis. Países como Bélgica, França e Países Baixos se destacam positivamente nesse aspecto. No entanto, em outras nações, como Polônia e Áustria, essas mesmas práticas também estão associadas a impactos negativos sobre ODS como Trabalho Decente (ODS 8) e Consumo Responsável (ODS 12).
O levantamento também identificou grupos de países com estruturas de interação semelhantes entre bioeconomia e ODS, sugerindo que políticas públicas regionalmente coordenadas podem ser mais eficazes. Alemanha, França e Áustria, por exemplo, formam um cluster caracterizado por um alto número de interações sinérgicas, associadas à implementação de estratégias nacionais de bioeconomia robustas. Já países do leste e sudeste europeu, como Macedônia do Norte e Moldávia, apresentam redes com forte presença de trade-offs, exigindo abordagens específicas para mitigar impactos adversos.
No critério-target mais detalhado, a análise mostra que o critério de infraestrutura para fortalecer economias rurais e urbanas (3.3) pode conflitar com a proteção de ecossistemas aquáticos (Meta 6.6). A ampliação de infraestrutura associada à bioeconomia, como usinas de bioenergia, pode agravar desmatamentos, aumentar a emissão de gases, elevar preços de alimentos e intensificar retiradas de água, se não acompanhada de políticas mitigadoras robustas.
O estudo destaca ainda o papel crítico do consumo insustentável (ODS 12), que exerce a maior influência negativa sobre a bioeconomia. Produtos renováveis, como bioplásticos, podem substituir plásticos convencionais mas, sem uma redução efetiva no consumo, sua produção pode agravar desigualdades sociais e continuar pressionando os recursos naturais.
As conclusões apontam para a necessidade urgente de revisar estratégias de bioeconomia. A ausência de transformação estrutural significativa ressalta que os conceitos de circularidade e sustentabilidade ainda não foram plenamente internalizados nas práticas em curso. Embora políticas em desenvolvimento, como o Pacto Ecológico Europeu, apresentem ambições em linha com a bioeconomia sustentável, falhas em áreas como consumo alimentar seguem gerando efeitos ambientais adversos, inclusive além das fronteiras europeias.
Para maximizar o papel da bioeconomia no avanço dos ODS, os autores recomendam aumentar a coerência entre políticas públicas, apostar na colaboração supranacional e desenvolver mecanismos de monitoramento dinâmico e direcionado. O estudo reforça que, mesmo com os avanços na formulação conceitual e ferramentas analíticas, é preciso um esforço coordenado para transformar o potencial da bioeconomia em efeitos concretos e alinhados a um desenvolvimento sustentável de fato.
Fonte: Bioeconomy and Sustainable Development Goals: How do their interactions matter?