Apesar de avanços recentes nas normas ambientais, o licenciamento ambiental da piscicultura no estado do Pará continua enfrentando entraves significativos. Uma pesquisa publicada na Revista GeSec analisou o cenário regulatório da atividade no estado e revelou um sistema marcado por informalidade, burocracia excessiva e fragmentação normativa.
O estudo, que utilizou dados da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (SEMAS) e georreferenciamento da plataforma MaPeixe, identificou apenas seis Licenças Prévias e quatro Licenças de Instalação ativas—todas vencidas—além de 41 Licenças de Operação concentradas principalmente em Belém, Santarém e Altamira. Essa distribuição irregular sugere desequilíbrios regionais gerados pela descentralização da gestão ambiental, que transfere aos municípios a responsabilidade por emissão e controle, mas sem infraestrutura técnica suficiente.
O novo Decreto Estadual nº 3.385/2023, apontado como um avanço por permitir cultivos de espécies exóticas sob controle e ampliar tipologias de produção, ainda não conseguiu produzir efeitos concretos. Segundo os autores, os obstáculos técnicos das prefeituras e o descompasso entre normas estaduais e federais mantêm o sistema engessado. A queda de 186 para apenas sete dispensas válidas de licenciamento ambiental entre 2024 e 2025 ilustra como critérios mais rígidos geraram reclassificações e dificultaram a formalização de pequenos empreendimentos.
A pesquisa também mostrou que 90% dos empreendimentos possuem menos de 2 hectares de lâmina d’água, o que os enquadraria na categoria de isenção de licenciamento, desde que atendam exigências técnicas. No entanto, a documentação irregular e a ausência de assistência técnica impedem que muitos produtores acessem esses benefícios.
Outro dado crítico revelado pelo cruzamento entre os dados da SEMAS e a plataforma MaPeixe foi a alta disparidade entre o número estimado de empreendimentos ativos e as licenças emitidas, revelando alto grau de informalidade. Nas regiões do Marajó e Nordeste Paraense, predomina uma aquicultura familiar de subsistência, com sistemas extensivos, pouco acesso a insumos e baixo suporte governamental.
Casos como o do município de Mãe do Rio, onde legislação local autoriza a outorga de uso da água para pequenos cultivos, exemplificam o conflito de competências entre esferas de governo e tornam evidente a necessidade de harmonização entre políticas públicas de diferentes níveis.
O estudo propõe que o licenciamento ambiental não seja apenas um mecanismo de controle, mas um instrumento de fomento à sustentabilidade e à formalização. Isso exige governança mais participativa, dados públicos integrados e fortalecimento institucional, com foco em pequenos produtores, cooperativas locais e digitalização dos processos.
A consolidação de sistemas como o SISLAM e o Licenciamento Ambiental Simplificado (LAS) surge como uma possível saída para desburocratizar o setor e incluir economicamente comunidades vulneráveis. Segundo os autores, fomentar a rastreabilidade, melhorar a infraestrutura ambiental e integrar ferramentas digitais de comercialização são medidas-chave para transformar o licenciamento em um motor de desenvolvimento econômico e ambiental na Amazônia.
Finalmente, a piscicultura no Pará carrega potencial para se tornar um elemento estratégico da bioeconomia amazônica. Contudo, a realização desse potencial dependerá da integração entre ciência, inovação e políticas públicas coerentes, capazes de alinhar objetivos de conservação ambiental com inclusão produtiva e geração de renda a partir dos recursos hídricos do estado.
