Um estudo apresentado na 6ª Conferência Internacional Eletrônica sobre Alimentos propôs uma solução viável para revalorizar um coproduto frequentemente negligenciado pela indústria de laticínios: o soro de manteiga (ou buttermilk). Com alto valor nutricional, mas uso limitado em pequenas e médias indústrias de países em desenvolvimento, o buttermilk foi testado como ingrediente na produção de kefir — bebida fermentada de consumo crescente no mercado de alimentos saudáveis.
O objetivo da pesquisa foi avaliar se diferentes proporções de mistura de leite integral com buttermilk poderiam resultar em um kefir com características físico-químicas e tecnológicas aceitáveis, abrindo caminho para usos mais sustentáveis desse excedente.
No experimento, foram testadas seis formulações, variando de 100% leite a 100% buttermilk. A análise focou em quatro parâmetros: composição nutricional, crescimento da biomassa de grãos de kefir, capacidade de retenção de água e sinérese (separação de fases).
Os resultados mostraram que o aumento da proporção de buttermilk leva a uma elevação linear do teor de umidade — de 89,70% (100% leite) para 96,57% (100% buttermilk). Em contrapartida, houve redução significativa nas concentrações de gordura (3,05% para 0,55%), proteína (3,43% para 1,89%) e carboidratos (3,34% para 0,63%).
Do ponto de vista tecnológico, o crescimento da biomassa de grãos de kefir foi maior nas formulações com maior conteúdo de leite: 150 g na composição com 100% leite, contra apenas 16,6 g na formulação com 100% buttermilk. Isso sugere que o buttermilk, isoladamente, não oferece as condições nutricionais ideais para o desenvolvimento dos grãos fermentadores.
Em paralelo, a capacidade de retenção de água caiu proporcionalmente com o aumento do buttermilk: de 52,4% (100% leite) para 18,6% (100% buttermilk). Essa redução foi atribuída ao menor teor de proteínas do buttermilk em relação ao leite (1,76% contra 3%).
Por outro lado, a sinérese — um indicador de instabilidade na estrutura do gel — aumentou nas formulações com maior presença de buttermilk, alcançando 73,9% no produto feito totalmente com buttermilk, contra 31,9% na fórmula com 100% leite. Isso aponta para estruturas de gel mais frágeis e maior separação de fases nos produtos com mais buttermilk.
A principal conclusão dos pesquisadores é que o uso do buttermilk para produzir kefir é tecnologicamente viável até um limite de substituição de 40% do leite. Acima desse percentual, os efeitos negativos sobre textura, retenção de água e desenvolvimento de biomassa tornam o produto menos adequado.
Esse achado tem implicações diretas para a bioeconomia no setor de laticínios: ao integrar de forma eficiente um coproduto subvalorizado em um processo de fermentação alimentar, a indústria pode reduzir desperdícios, diversificar suas linhas produtivas e fomentar práticas mais sustentáveis, especialmente em contextos de menor escala.
Além disso, o estudo indica caminhos para ampliar a rentabilidade das pequenas e médias indústrias por meio do aproveitamento local de matérias-primas. No médio prazo, a adoção dessa prática poderia reforçar cadeias curtas de abastecimento com menor impacto ambiental, alinhando-se às visões de bio-recurso e bioecologia da bioeconomia.
Fonte: BIOECONOMY IN THE DAIRY INDUSTRY: APPLICATION OF BUTTERMILK IN KEFIR PRODUCTION
