UNIDIR alerta para riscos da ciberbiosegurança na paz e na segurança internacionais

Laboratórios biológicos conectados à internet, sistemas de automação avançados em pesquisa genética e o uso crescente de inteligência artificial em biotecnologia têm trazido avanços significativos. Mas também expõem novas fragilidades: ameaças cibernéticas capazes de impactar a saúde global, o meio ambiente e a segurança internacional. É esse o alerta central do estudo “Cyberbiosecurity: A Matter of International Peace and Security?”, publicado pelo Instituto das Nações Unidas para Pesquisa em Desarmamento (UNIDIR).

O conceito de ciberbiosegurança surgiu da necessidade de proteger sistemas biotecnológicos — cada vez mais dependentes de infraestruturas digitais complexas — contra ameaças cibernéticas. Nesse contexto, os riscos extrapolam falhas operacionais: incluem invasões que alteram experimentos biomoleculares, manipulação de sequências genéticas e até ataques que possam desacreditar vacinas por meio de campanhas de desinformação.

De acordo com o relatório, o número de laboratórios de alta contenção biológica (como os BSL-4), bem como os de contenção média (BSL-2 e BSL-3), está crescendo em ritmo acelerado, acompanhando a expansão da bioeconomia. Ao mesmo tempo, cresce a interconectividade dessas instalações com redes automatizadas e computação em nuvem, como no caso dos chamados “cloud labs”, onde robôs realizam experimentos remotamente.

Essas inovações abrem espaço para novos vetores de risco. O estudo aponta diferentes formas de ameaças cibernéticas: das passivas — como coleta não autorizada de dados genômicos — às ativas, como manipulação de substâncias químicas durante sua produção automatizada, algo que pode resultar em compostos ineficazes ou perigosos. Em casos mais graves, tais incidentes podem causar danos à confiança pública, à saúde e até à estabilidade internacional.

Apesar da gravidade dos riscos, a atenção multilateral ao tema ainda é limitada. O assunto aparece de forma periférica nas discussões da ONU sobre cibersegurança, com poucos esforços específicos no contexto da Convenção sobre Armas Biológicas (BWC). Contudo, começam a surgir referências isoladas, como na proposta apresentada pelo Canadá em 2022 e nas menções feitas por Estados Unidos, Europa e Rússia em conferências internacionais.

O relatório sugere que a ciberbiosegurança deve ser incluída de forma mais estruturada nos fóruns diplomáticos e técnicos internacionais. Entre as propostas estão a criação de marcos regulatórios específicos, maior cooperação entre atores da cibernética e da biotecnologia e uso de plataformas como o Cyber Policy Portal da UNIDIR para transparência e troca de boas práticas.

No plano nacional, iniciativas como as da França, Argentina, Paquistão, Rússia e Turquia demonstram que medidas concretas podem ser adotadas. Elas incluem desde protocolos de backup e controle de acesso digital até sistemas nacionais de vigilância em segurança biológica. No entanto, apenas 20 dos 187 países signatários da BWC implementaram ações relacionadas à ciberbiosegurança até o momento.

O relatório conclui que é urgente estabelecer uma abordagem integrada para a ciberbiosegurança que abarque biossegurança, bioética e proteção cibernética. O primeiro passo seria colocar o tema na agenda multilateral, especialmente nos debates em curso no grupo de trabalho da ONU sobre tecnologias emergentes e na própria Convenção sobre Armas Biológicas.

Sem esse reconhecimento institucional, os riscos associados à convergência entre biotecnologia e tecnologias de informação tendem a se intensificar, colocando em xeque os ganhos potencialmente transformadores da bioeconomia. A regulação proativa e o compartilhamento internacional de informações e boas práticas aparecem como as vias mais consistentes para mitigar esse cenário.

Fonte: Cyberbiosecurity: A Matter of International Peace and Security?

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