Transformar resíduos agroindustriais em combustíveis e insumos químicos é uma das frentes mais promissoras para a bioeconomia circular. Um estudo apresentado no 9º Congresso Internacional de Ciências para Estudantes, realizado na Turquia, testou justamente essa estratégia ao converter resíduos da produção de suco de maçã — conhecidos como bagaço de maçã — em bio-hidrogênio e ácido butírico por meio de fermentação anaeróbica.
Os pesquisadores Umar Muazu Yunusa e Ilgi Karapınar, da Universidade Dokuz Eylül, em Izmir, utilizaram a bactéria Clostridium tyrobutyricum para fermentar o hidrolisado do bagaço de maçã preparado por extração térmica. A matéria-prima continha 51,05 g/L de açúcares fermentáveis. A produção foi realizada em frascos de fermentação sob atmosfera de nitrogênio puro, mantendo condições anaeróbicas por seis dias a 37 ºC.
Durante o processo, o hidrogênio foi gerado a uma taxa volumétrica de 289,74 mL/L·dia, enquanto a produção cumulativa atingiu 117,41 mL. O rendimento de hidrogênio por mol de glicose foi de apenas 0,86 mol H₂/mol, um valor abaixo do esperado para esse tipo de substrato. Segundo os autores, a baixa taxa de conversão está relacionada à limitada assimilação de açúcares — apenas 21% dos açúcares presentes foram consumidos ao longo do experimento.
O ácido butírico começou a ser produzido apenas após 24 horas de incubação, atingindo um pico de 5,29 g/L ao final do sexto dia. O perfil de crescimento dos ácidos mostrou uma fase exponencial entre 24 e 48 horas, onde o composto atingiu quase 4 g/L. Essa fase ativa coincide com o crescimento logarítmico da população bacteriana, o que impulsionou a conversão da glicose presente no meio em hidrogênio e ácidos orgânicos.
Contudo, após 48 horas, observou-se uma desaceleração na produção tanto de ácido butírico quanto de hidrogênio. Os pesquisadores apontam inibição por produtos, esgotamento do substrato e a limitação de nutrientes como possíveis causas para esse comportamento. Uma leve retomada no final do processo sugere degradação lenta de resíduos complexos ou ativação de vias metabólicas secundárias.
O experimento também investigou se o substrato permitiria a produção de solventes como acetona, butanol ou etanol (processo conhecido como ABE). No entanto, mesmo com modulação da fonte nitrogenada — limitada a 1 g/L cada de peptona e extrato de levedura —, não houve geração de solventes. A mesma ausência de produção de ABE foi observada em estudos anteriores mesmo com concentrações maiores desses nutrientes.
Uma comparação com trabalho anterior dos mesmos autores revela que a adição de maiores níveis de fontes nitrogenadas — 10 g/L de peptona e 13 g/L de extrato de levedura — leva a uma taxa de produção de hidrogênio significativamente mais elevada, de até 744,51 mL/L·dia. Isso indica que o aporte nutricional adequado é um limitante crítico para alcançar melhor desempenho no processo fermentativo.
Embora os valores obtidos neste estudo estejam aquém de benchmarks industriais, os resultados reforçam o potencial técnico do bagaço de maçã como matéria-prima para obtenção de energia renovável, especialmente se estratégias de otimização de nutrientes forem aplicadas. Além disso, a conversão de resíduos lignocelulósicos em biocombustíveis e ácidos orgânicos agrega valor às cadeias agroindustriais e contribui para redução da dependência de combustíveis fósseis.
Segundo os autores, futuros estudos devem explorar combinações de pré-tratamentos mais eficientes, formulações otimizadas de nutrientes e uso de co-substratos para melhorar os rendimentos de produtos energéticos e bioquímicos.
