A integração da bioeconomia aos modelos macroeconômicos tradicionais ainda é incipiente, apesar do crescente papel dessas tecnologias na transição para uma economia de baixo carbono. Em um estudo recente publicado na revista Cleaner Environmental Systems, pesquisadores propuseram um arcabouço para incorporar tecnologias da bioeconomia — como bioenergia, bióquimicos e biomateriais — nos principais pilares macroeconômicos: oferta, demanda, Produto Interno Bruto (PIB), mercados e impactos socioeconômicos.
Utilizando uma revisão sistemática da literatura e modelagem qualitativa por dinâmicas de sistemas, o trabalho cobriu não só os benefícios, mas também os limites e riscos relacionados à bioeconomia. Um dos achados mais expressivos está na geração de empregos: tecnologias da bioeconomia criam, em média, 2,5 empregos totais por MW instalado, incluindo empregos diretos, indiretos e induzidos. Esses efeitos são particularmente relevantes em áreas rurais e contribuem para mitigar desigualdades regionais.
No lado da oferta, o estudo alerta para a escassez de biomassa, ressaltando que aumentar a produção para suprir a demanda por materiais e energia renováveis pode gerar pressões sobre solo, água e biodiversidade, especialmente se forem utilizados insumos primários em larga escala. Nesse contexto, a priorização do uso de biomassa residual e de segunda geração emerge como condição essencial para evitar conflitos com a segurança alimentar e impactos ecológicos.
Do ponto de vista da demanda, o comportamento do consumidor é um fator crítico. A disposição a pagar por produtos bio-baseados ainda é limitada e impactada por renda disponível, percepção de valor e conhecimento sobre sustentabilidade. O estudo destaca também o risco de “efeito rebote”, quando produtos considerados sustentáveis são consumidos em excesso sob falsa percepção de impacto nulo, como já se observa com os bioplásticos.
Em relação ao PIB, o trabalho revela efeitos diversos. Em países com menor dependência de petróleo, a substituição por bioenergia e bioplataformas químicas pode melhorar a balança comercial e agregar valor às cadeias de produção interna. No entanto, em países exportadores de combustíveis fósseis, a adoção de políticas agressivas de bioeconomia pode reduzir receitas públicas, exigindo novas estratégias fiscais para mitigar esses efeitos negativos.
Com base nos mercados mapeados no estudo — mercado de fatores, mercado de biomateriais e mercado de produtos finais — os autores defendem a criação de estruturas transparentes e reguladas que favoreçam pequenos produtores e promovam uma estrutura de mercado competitiva. A articulação entre esses mercados é vital para sustentar a expansão da bioeconomia e reduzir vulnerabilidades ao longo das cadeias produtivas.
Os pesquisadores também destacam a necessidade de internalizar os custos sociais do carbono nos preços dos combustíveis fósseis. Com políticas como taxa de carbono ou participação em mercados de carbono, o custo relativo de produtos bio-baseados pode se tornar mais competitivo. Simulações indicam que um valor de US$ 100/tCO2 pode tornar o biogás economicamente viável frente ao gás natural para usos energéticos e industriais.
Entre os principais desdobramentos propostos estão o incentivo a políticas fiscais verdes, o uso estratégico de compras públicas para gerar demanda inicial por produtos bio-baseados, e o aprimoramento de certificações que evitem o greenwashing e tragam credibilidade à oferta de produtos sustentáveis.
A convergência entre política macroeconômica e bioeconomia representa uma oportunidade estratégica para alinhar crescimento econômico a metas ambientais. Mas, como o artigo sugere, essa convergência exige planejamento sistêmico, integração entre ciência, mercado e políticas públicas, e atenção permanente aos efeitos colaterais possíveis sobre emprego, desigualdade e conservação ambiental.
