Uma nova pesquisa realizada no Território Indígena Pimentel Barbosa, no Cerrado brasileiro, revelou um potencial inexplorado de 180 toneladas por ano de resíduos de biomassa que poderiam ser aproveitados para fins alimentares, energéticos e medicinais. O estudo, conduzido por pesquisadores da Universidade de Tecnologia de Cottbus-Senftenberg (Alemanha) e da Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), analisou a disponibilidade e a atual utilização de biomassa na comunidade Xavante, com foco no aproveitamento local e sustentável de recursos biológicos.
O trabalho dividiu o potencial de biomassa em três categorias: teórico (2700 t/ano), prático (516 t/ano) e não aproveitado (180 t/ano). Enquanto o teórico indica a quantidade máxima possível de biomassa disponível, o prático reflete o que já é consumido pela população. Já o não aproveitado aponta para resíduos que hoje são descartados, como cascas e sementes de frutas e palmeiras nativas, e que poderiam ser convertidos em valor.
Entre os resíduos com maior potencial estão sementes de Pequi, Manga e Buriti, além de cascas do Babassu. Atualmente, esses materiais são jogados no ambiente ou degradam-se naturalmente. Segundo os autores, esses resíduos poderiam ser utilizados na geração de energia por processos termoquímicos como a pirólise, ou transformados em produtos alimentícios e medicinais.
O estudo também destacou os desafios enfrentados pela comunidade. A intensificação da agricultura no entorno da terra indígena tem provocado degradação ambiental, afetando diretamente a segurança alimentar dos Xavante. A perda de fertilidade do solo, a escassez de água e a dificuldade de acesso a eletricidade comprometem a subsistência, aumentam a dependência de alimentos industrializados e impactam a saúde local.
A pesquisa combinou métodos qualitativos e quantitativos, com entrevistas a professores indígenas e observações diretas sobre práticas de subsistência, como caça com fogo controlado, coleta de frutas e cultivo de mandioca e milho em pequena escala. O estudo mostrou que a produção agrícola é limitada pela baixa fertilidade dos solos e pela ausência de rotação de culturas, o que reduz tanto a produtividade quanto os resíduos disponíveis para aproveitamento.
Os pesquisadores propõem cenários de aproveitamento dos resíduos orgânicos que favorecem primeiro os usos alimentares e medicinais, deixando a geração de energia como último recurso. Bioprodutos derivados dessas biomassas vão desde óleos com propriedades antioxidantes até biochar para uso como fertilizante. A extração desses produtos dependeria da combinação de saber tradicional e validação científica.
Para viabilizar esses usos, no entanto, é necessário superar entraves logísticos, técnicos e culturais. A proposta dos autores inclui um modelo de contratação de biomassa, onde cooperativas indígenas organizariam a coleta, e um prestador de serviços cuidaria da transformação e distribuição, assumindo os custos operacionais. Essa abordagem poderia gerar renda e reduzir a dependência externa por alimentos e combustíveis fósseis.
O estudo ressalta que a bioeconomia indígena deve ser construída com base em conhecimento ancestral, respeitando valores culturais e promovendo justiça territorial. Os autores defendem que políticas públicas específicas e o apoio institucional são essenciais para transformar o potencial identificado em benefícios concretos para comunidades indígenas e para a conservação do Cerrado.
Com essa metodologia, os autores oferecem um modelo replicável para avaliar o potencial de biomassa em outros territórios indígenas ou rurais, fortalecendo uma bioeconomia inclusiva e adaptada a contextos locais.
