Um crime fora de moda e o futuro inspirado por indígenas

Em um olhar retrospectivo para a indústria da moda, cuja história está marcada pela exploração de espécies silvestres para a confecção de peças de luxo, um futuro mais consciente e sustentável começa a se desenhar, inspirado na sabedoria indígena e no respeito à biodiversidade. Reportagens recentes evidenciam a transformação em curso, destacando tanto o passado sombrio quanto as iniciativas que apontam para uma nova era na moda.

Destaca-se, neste contexto, a trágica perseguição à ariranha (Pteronura brasiliensis), um animal aquático que outrora adornava casacos e ornamentos de alta sociedade. Segundo a pesquisadora Caroline Leuchtenberger, coordenadora do Projeto Ariranhas, apenas no Porto de Corumbá foram contabilizadas aproximadamente 12 mil peles entre os anos 60 e 70. A caça desenfreada colocou esta espécie na categoria Em Perigo de extinção na Lista Vermelha da IUCN.

Enquanto a indústria têxtil ocupa a posição de segunda mais poluente globalmente, ficando atrás só do setor petrolífero, movimentos como o Slow Fashion começam a ganhar corpo. O Slow Fashion propõe uma maneira de produzir e consumir vestuário de forma diligente e ecologicamente responsável, contrastando com o modus operandi acelerado e insustentável dos grandes conglomerados.

Em contraparte às políticas de proteção da fauna que, por um lado, ajudam a frear o tráfico ilegal e o comércio de peles, por outro, impuseram desafios aos povos indígenas. Tradicionalmente, estas comunidades utilizam elementos animais em suas práticas culturais, tais como cocares e peles de onça em rituais. Naine Terena, comunicadora e artista, e Paulo Apurinã, liderança indígena, expressam a complexidade de assegurar a conservação da fauna enquanto se respeita o valor cultural e as práticas ancestrais dos povos originários.

A emergência de marcas indígenas de moda, como Sioduhi Studio, testemunha a crescente conscientização sobre a importância de práticas sustentáveis e o respeito pelas tradições milenares. O fundador da Sioduhi Studio, representante do povo Piratapuya, ressalta que sustentabilidade é mais do que um método de produção; é uma filosofia de negócios e um movimento em massa.

Viscose, um tecido semi-sintético derivado de fontes naturais e renováveis, é um exemplo de material usado em prol de uma abordagem mais sustentável na moda. O criador destaca que sua marca foca em peças com até 80% de tecidos certificados oriundos da Áustria. Este empreendimento e outros, como Yanciã e Vanda Witoto, ilustram o potencial para práticas regenerativas que já são inerentes às culturas indígenas, como a utilização do tecido do tururi ou da fibra do tucum.

A ressonância desses esforços na bioeconomia e na moda sustentável não é apenas uma tendência, e sim um indicativo da capacidade inerente das sociedades de se adaptarem e evoluírem para modelos de desenvolvimento mais harmoniosos com o meio ambiente. Este é o caminho que se desenha no horizonte da indústria da moda: um compromisso renovado com a ética, a sustentabilidade e a preservação dos saberes ancestrais.


Fonte: https://oeco.org.br/reportagens/um-crime-fora-de-moda-e-o-futuro-inspirado-por-indigenas/

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